O
homem que quer imprimir o ser humano.
Por:
Paula Rothman
Foto: Pesquisador Vladimir Mironov
O
cientista russo Vladimir Mironov tem um sonho: imprimir em 3d órgãos
e tecidos humanos. Ele já fez avanços e escolheu o Brasil para suas
pesquisas. Em parceria com especialistas do TI,
um Centro Público de Pesquisas em Campinas (SP),
Mironov dá os primeiros passos na
bioimpressão
e
os resultados já são impressionantes.
Foto: Protótipo
criado no Brasil. Acoplada a um braço robótico, a máquina poderá
imprimir células diretamente na pele.
Foto:Esquema da impressão de tecidos.
O
sonho do cientista russo Vladimir Mironov é imprimir um rim. Seu
grande objetivo é criar uma máquina capaz de depositar, camada a
camada, as células que formam um dos mais complexos órgãos do
corpo humano. Parece coisa de louco. E ele sabe disso. “Muitas
pessoas não acreditam quando falo sobre isso”, afirma Mironov, com
a voz calma destoando de seu imponente 1,90 metro de altura.Com
toda a paciência do mundo, Mironov tira os óculos quadrados,coça
levemente a barba branca e começa a explicar. “Existe uma frase
famosa que define bem o espanto das pessoas quando falo em imprimir
órgãos”, diz Mironov, citando a frase: “Qualquer tecnologia
suficientemente avançada não pode ser diferenciada e mágica”. A
citação é de Arthur C. Clarke, autor de livros de ficção como
2001
— Uma Odisseia no Espaço.
A
tecnologia a que Mironov se refere é a bioimpressão, uma fantástica
forma de criar tecido vivo, feito de células, usando uma impressora
3D. Em menos de uma década, estruturas feitas de cartilagem, como
orelhas ou meniscos, serão impressas em uma máquina 3D e
implantadas no corpo.Estimativas
de cientistas e do governo americano apontam que até 2030 será a
vez de órgãos complexos,como rim, coração e pulmão. “É um
projeto demorado, mas quero e vou imprimir um órgão”, afirma
Mironov.
Os
planos do russo vão além. Eles incluem criar um braço robótico
para curar feridas com jatos de tinta viva e uma forma de eliminar a
calvície imprimindo cabelo diretamente na pele. Com quase duas
décadas de experiência, Mironov é um dos pioneiros no mundo da
bioimpressão. Aos
59 anos, é no Brasil que planeja tirar grande parte desses projetos
do papel. “Estamos tornando a ficção científica realidade com
tecnologia criada aqui no Brasil”, afrma. O local escolhido pelo
russo para suas pesquisas o Centro de Tecnologia da Informação
Renato Archer (CTI), em Campinas, no interior de São Paulo.
Às
margens da rodovia Dom Pedro I,o órgão público ligado ao
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação lembra um grande
campus universitário,com prédios baixos e muita área verde, onde
trabalham 450 pessoas. Ali funciona o maior laboratório de pesquisa
em 3D do Brasil. Todos
os anos, cerca de 500 pacientes do sistema público de saúde recebem
próteses de mandíbula, crânio e até de nariz graças às
pesquisas do CTI. Usando um programa de computador próprio, eles
transformam imagens de tomografa e ressonância magnética em modelos
tridimensionais que permitem projetar e imprimir peças que se
encaixam em regiões afetadas. Mas,
como a Anvisa ainda não permite que material impresso em 3D seja
implantado no corpo, as peças se tornam moldes para a criação de
próteses. “Recebemos muitos casos de pessoas que perderam parte
dos ossos da face para tumores ou em acidentes”, diz Jorge Vicente
Lopes da Silva, coordenador da divisão de tecnologias
tridimensionais do CTI.
Agora
imagine que, no lugar de peças de material artificial, todos esses
pacientes pudessem receber partes reconstruídas com as próprias
células. Feitas de carne e osso. É esse o potencial da parceria
entre o CTI e Vladimir Mironov. O centro possui muita experiência em
software e hardware. O russo tem na bagagem conhecimentos de biologia
e design.
Foto: detalhamento da impressão de tecido biológico
O
cabeçote que libera tinta está sendo projetado para permitir que
jatos diferentes saiam ao mesmo tempo, nos moldes de uma impressora
construída por Mironov nos Estados Unidos. A tinta será formada por
células do próprio paciente, tratadas em laboratório
e encapsuladas em grupos. Essas unidades de 0,2 milímetro, chamadas esferoides teciduais, são utilizadas por pesquisadores do mundo inteiro. Enquanto deposita os esferoides, a máquina também libera duas substâncias: trombina e fibrinogênio. Elas se combinam formando a fibrina, que atua como cola para manter cada camada fixa. A última etapa será amadurecer o órgão em uma espécie de estufa,chamada biorreator, até que esteja pronto para a etapa do transplante.“Leva tempo para que as células aprendam a funcionar em conjunto”, diz o professor Lipson, de Cornell.
e encapsuladas em grupos. Essas unidades de 0,2 milímetro, chamadas esferoides teciduais, são utilizadas por pesquisadores do mundo inteiro. Enquanto deposita os esferoides, a máquina também libera duas substâncias: trombina e fibrinogênio. Elas se combinam formando a fibrina, que atua como cola para manter cada camada fixa. A última etapa será amadurecer o órgão em uma espécie de estufa,chamada biorreator, até que esteja pronto para a etapa do transplante.“Leva tempo para que as células aprendam a funcionar em conjunto”, diz o professor Lipson, de Cornell.
Em
2005, Lipson coordenou o grupo que imprimiu um menisco, cartilagem em
forma de C que costuma dar problemas no joelho de jogadores de
futebol e esportistas. A peça tinha o formato e a constituição
idênticos aos de um menisco natural, porém era muito mais fraca. “A
cartilagem precisa de pressão para ficar forte. No joelho, as
células sofrem isso naturalmente. Após a impressão,descobrimos que
era preciso criar essas condições no biorreator”, afirma Lipson,
que conheceu Mironov em encontros acadêmicos. “Ele é uma das
pessoas que puxam os avanços nesse setor. É um dos pioneiros”,
diz sobre o russo.
Fonte:
ROTHMAN,P. O
homem que quer imprimir o ser humano.
Exame INFO, edição 335, novembro de 2013.
Nenhum comentário:
Postar um comentário